publicado em arquitetura por marisa figueiredo | 9 comentários
Os ecrãs de cinema sempre foram pródigos em fomentar a nossa imaginação relativamente às cidades do futuro. Em O Quinto Elemento, os carros entrecruzam-se vários metros acima do solo. Alphaville mostra-nos uma urbe em que a lógica eliminou as emoções. Os robots fazem parte do quotidiano de A.I. - Inteligência Artifical. E isto só para citar alguns exemplos. Mas no deserto árido do Médio Oriente talvez o futuro seja já uma realidade, sem necessidade de robots ou carros voadores.
Em Masdar City, cidade planeada para um balanço neutro em emissões de carbono, os carros não são permitidos, a não ser que sejam eléctricos. A mobilidade é, aliás, uma das bases desta cidade sustentável em Abu Dhabi (um dos estados que, tal como o Dubai, faz parte dos Emirados Árabes). As deslocações fazem-se sobretudo a pé, ou através de uma rede de veículos eléctricos.
Actualmente, a Abu Dhabi Future Energy Company, entidade que coordena o planeamento e a implementação de Masdar, está a testar o Superbus. O protótipo de aspecto futurista, inteiramente movido a electricidade, tem seis rodas e doze portas, com uma capacidade de 23 lugares. Já o design não poderia estar mais longe dos autocarros (ônibus) tradicionais, fazendo lembrar uma versão alongada do carro de Michael Knight, em O Justiceiro (A Super Máquina, no Brasil).
Contudo, não deixa de ser irónico que o dinheiro necessário para criar uma cidade “verde” tão ambiciosa venha, precisamente, do petróleo. Só desta forma o emirado árabe consegue arcar com o investimento estimado de 19 mil milhões de dólares, que serão aplicados até 2025. Mesmo assim, e devido à retracção da conjuntura económica, o projecto teve que ser revisto em baixa, depois de um projecto megalómano inicial que previa um investimento de 22 mil milhões de euros e a finalização da primeira fase em 2009. Um planeamento mais realista aponta para 2015 como horizonte do final da primeira fase.
É do deserto que vem a maior fonte de inspiração e de dificuldades para a concretização de Mascar City. Até porque uma cidade que se espera que albergue meio milhão de pessoas deverá ter resposta pronta para as exigências de climatização. Por outro lado, a inspiração conceptual teve origem nos povos ancestrais, cujo modo de vida era sustentável e em comunhão com a Natureza.
O primeiro passo assenta, por isso, no planeamento. A ideia é que edifícios e ruas mais bem planeados terão menores necessidades de consumo. A orientação das fachadas e as ruas estreitas – sem a preocupação de espaço para os automóveis – e com aragens de vento tornam a cidade mais fresca do que qualquer outra naquela região.
Não obstante, Masdar City vai funcionar a partir do sol. Uma grande central fotovoltaica de 100 megawatts já está operacional, servindo para alimentar os primeiros edifícios da cidade e as actividades de construção no local. Em paralelo, os edifícios terão água quente aquecida por painéis de solar térmico. Ainda em estudo estão outras opções energéticas como a geotermia ou o solar de concentração, tecnologia que ainda está numa fase incipiente de desenvolvimento.
Numa fase inicial, o consumo energético da cidade será totalmente suportado pela produção renovável local. À medida que a cidade crescer, outras opções serão consideradas, sempre de fonte renovável. A produção local de energia nunca será inferior a 20 por cento, num cenário a médio prazo.
Os planos para Masdar City incluem ainda uma gestão eficiente da água e uma central de dessalinização com recurso à energia solar. As autoridades da cidade tentarão igualmente que todo o lixo seja valorizado, quer através de fertilizantes para o solo, quer para a produção de energia através da incineração. Plásticos e metais serão reciclados ou reutilizados.
Em construção a poucos quilómetros da cidade de Abu Dhabi, Masdar é um oásis para qualquer ambientalista e um pólo de atracção empresarial da economia verde. Mais do que formar cidades desprovidas de emoções, como em Alphaville, a tecnologia de hoje permite que os centros urbanos sustentáveis do amanhã saiam do papel. Resta saber se Masdar City se tornará um exemplo para o resto do mundo… ou mais um capricho restrito para as elites do petróleo.
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